Fragmento conto
ANA
Manhã de um domingo qualquer. As pessoas caminham pelas ruas voltando da igreja e levando para casa o frango que reservaram na venda que ainda comercializa as aves abatidas. Num barracão pendurado por uma corda na margem de um córrego mau cheiroso, Ana abre os olhos. 17 anos, estudos interrompidos, mãe, desempregada, bolsa família atrasada, expulsa de casa pelo pai alcoólatra e dependente do companheiro que vive do trafico. Ana esfrega os olhos com as mãos que parecem lixas e senta-se na beirada da cama como se sentasse na beirada de um abismo. Pensa em desistir de saltar fora ao dia e em ficar deitada. Abatida. Mas não pode, não tem esse privilégio e ainda se culpa ao lembrar que essa realidade é também compartilhada por centenas de pessoas desse lugar que sobrevive sorrindo.
Como de costume nos domingos, Ana com muito custo sai pelas ruas que começam largas e logo se estreitam como se fossem espremer quem caminha por elas a qualquer momento. Observa tudo de um jeito que nunca tinha observado. Portas escoradas. Na beira esgoto a céu aberto, carroças encostadas com cavalos que puxam toneladas de entulho todos os dias. No ponto mais alto da vila, o velho manequim que é vestido com roupas pretas sempre quando alguém vai morrer. O boneco não está nú, está vestido de luto. Sinal de perigo. Nada de anormal, tudo certo...
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