Pular para o conteúdo principal

Abóboras

Fragmento de um conto.


       "Eu sou um trator. Ouviram? Sou o novo trator de Minas". Todos acharam normal a fala do prefeito de Abóboras na festa de inauguração dos buracos da trincheira. A guerra estava chegando e talvez por isso ninguém tenha estranhado. No outro dia, no seu gabinete, o prefeito começou a cavar com as próprias mãos, os buracos que ficariam para sempre na memória da cidade. Não demorou muito e os partidos começaram a se preparar para a guerra enviando militantes para os gabinetes, oferecidos em troca de dinheiro e de silêncio. Pouco a pouco, todos escolhiam o lado mais previsível e mais conveniente da trincheira. Enquanto isso, Abóboras seguia tranquila se adaptando aos novos e fantásticos decretos do prefeito. Um dia, ele decidiu proibir que o enxergassem como humano. Irredutível na ideia de ser um trator, determinou que todos deveriam olhar para ele e o ver, coisa, objeto amarelo, pesado.
       Abóboras era uma cidade de famílias e coronéis, quase esquecida no meio da região central de um grande estado. A pesar de produzir muitas riquezas, entre elas, fumaça e lendárias histórias sobre a origem da cidade, também produzia muita pobreza. E a pobreza cultural afetava como uma praga todos os burocratas da cidade. Tentavam resolver o problema Incompreensível investindo anualmente uma considerável quantia de dinheiro público para implementar arenas, onde assistiam animais sendo torturados e comemoravam as aparências. Os eventos decadentes ajudavam ainda mais a proliferar a praga. Contaminavam grande parte da população e eram tidos como um marco da gestão do governo pelos próprios governistas. Não sendo suficiente, foi criado um departamento com burocratas experientes, só para tratar dos assuntos culturais e cujo o objetivo principal, era paralisar a imaginação e coibir a ação de poetas e artistas tidos como uma ameaça constante para os bons costumes da sociedade Abóbrense...


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Colorido só por fora: contos periféricos

Lançado em 17 de julho de 2015, na periferia de Contagem (MG). "Colorido só por fora: contos periféricos" reúne doze contos que narram o cotidiano da periferia mineira. Com uma proposta de obra interativa, a capa do livro pode ser colorida pelo leitor. Cada capa pode ser única, diferente e compartilhada no blog ou no facebook do autor. AUTOR: Jessé Duarte REVISÃO: Fabiola Munhoz ILUSTRAÇÃO: Rodrigo Marques PROJETO GRÁFICO: Gilmar Campos ORIENTAÇÃO: Filipe Fernandes EDITOR: Marcelo Dias Costa CLIQUE AQUI PARA COMPRAR ******* APRESENTAÇÃO Por Daniela Graciere Atriz, artista visual e pesquisadora cultural de Contagem (MG).  Um sentimento paradoxal me vem ao ler “Colorido-só-por- fora”. A beleza das palavras sobre algo triste da periferia, que por muitas vezes, não passa de ser a simples realidade encontrada sob uma ótica de um ator marginal. Alguns podem achar fatalista, no entanto, a fatalidade está escancarada na realidade que é pintada por...

À Cidade de Contagem - Poesia

Cidade de Contagem? Quem conta essa cidade? Será mesmo uma cidade? O que se conta em contagem? O tempo do operário na produção o dinheiro desviado que não chegou na população? O que contam seus poetas cidade poluída? São loucos? Iguais trabalhadores na forja das dores na trova dos favores? Contam, que a cidade de faz de conta(gem) se perde dela mesma nas mãos de famílias e coronéis do trafico de influencias. Contam, que já não gritam nos piquetes. Silenciam a custo dos recursos do (sus)to da ameaça. Traficoronelismo das aparências mortais morais mentais. Contam, as horas nas filas dos hospitais os moradores desesperados. Desamparados desesperançados desacreditados. Que o politico disse que faria e não fez. Deixou pro próximo e o pai passou a vez. Herança maldita dos senhores do alho, do asfalto e das novas contagens que surgem da fumaça industrial. Embaçam a escravidão infantil. Oferecem abobrinhas para sanar a fome e educam com chaminés. Tir...

Apoema Sarau Livre: poesia pra quê?

Por, Jessé Duarte Este texto é uma contribuição reflexiva sobre uma ação cultural independente e seus desdobramentos para a cidade de Contagem, MG. Contagem produz mais do que fumaça, só é preciso olhar através do fuligem abandonada pelas industrias. Apoema, palavra da língua Tupi, significa: aquele que enxerga longe.  Apoema Sarau Livre e a realidade cultural de Contagem O “Apoema Sarau Livre” começou em 2013, tendo diante de si, o desafio de enfrentar as barreiras geradas por um contexto social marcado pelo abandono cultural histórico na cidade de Contagem. A população não encontrava opções de acesso a cultura, estabelecidas e desenvolvidas de forma continua. Quase sempre, restava apenas a escolha de migrar para Belo Horizonte em busca de alternativas.  Contagem, é uma das maiores cidades de Minas Gerais, sendo a terceira mais rica e contraditoriamente uma das piores em qualidade de vida. No campo da cultura, a realidade marcada pelas politicas de...