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SOBRE O ORÇAMENTO CULTURAL DE CONTAGEM EM 2017

O jornal "O tempo Contagem" desta sexta, 13 de janeiro, traz uma matéria sobre a falta de orçamento cultural estruturante para a cidade. Na matéria constam algumas falas minhas, que foram retiradas de uma postagem que fiz no facebook, ainda no início do ano, chamando a atenção para a falta de orçamento, o descaso histórico com cultura local e o que significou a ausência de um vereador com um olhar sensível para cultura dentro da Câmara Municipal de Contagem.

Infelizmente, a falta de um debate sério e de um olhar para questão na câmara, levou a aprovação de um orçamento sem a reflexão de suas consequenciais para a cidade. Muitos dos vereadores que votaram a favor do projeto de lei, que estima as receitas do orçamento em 2017, são hoje, secretários de governo e ate vice-prefeito. Por tanto, deixaram para si mesmos um problema que necessita respostas há anos e precisa ser resolvido.

O orçamento previsto para cultura em 2017 é de apenas 0,13% da receita municipal. Menos do que meio por cento, não chega a 0,2%. Uma vergonha para uma cidade que se encontra entre as trinta mais ricas do Brasil. O orçamento está previsto na PL 024/2016. Aprovada por unanimidade na câmara dos vereadores, a lei estima as receitas e fixa as despesas do orçamento – contempla as alterações promovidas na revisão do Plano Plurianual e a receita projetada na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias),

Isso significa que a prefeitura e os vereadores preveem R$ 2.440.400 (dois milhões e quatrocentos e quarenta mil e quatrocentos reais) para cuidar do nosso enorme patrimônio cultural abandonado: cinema e teatros fechados a mais de sete anos, biblioteca municipal jogada às traças, galeria de arte que funciona com administração burocrática, cursos de capacitação artística, incentivo e apoio a projetos locais etc.

A cultura também é um direito que precisa de ser respeitado e garantido pelo poder público, assim como a educação, a saúde e o transporte coletivo. Lamentavelmente nos últimos anos, esse direito tem sido tratado sob a ótica do produto e do evento. Os próprios mecanismos de apoio a projetos, recém criados, já foram sucateados como tudo na gestão passada. Neste caso, com omissão e editais que não privilegiam a continuidade de ações, a pesquisa e a manutenção de atividade já estabelecidas na cidade.

Sem orçamento, fica mais perceptível a possibilidade de ações pontuais por parte do poder público, o que pode significar um aprofundamento, ou um desdobramento, das políticas de eventos. Entende-se política de ventos, aquela que não tem perspectiva de continuidade, mas que acaba passando a impressão de que algo está acontecendo. Avessa a uma política pública que prevalece independente do partido que esteja na gestão, uma política de eventos acaba sendo uma saída improvisada a cada novo prefeito de Contagem.

Para explicar melhor a armadilha de ações ações pontuais, pela falta de investimento mínimo para implementar uma política pública, Imaginem, por exemplo, a saúde sem orçamento. Isso faria obviamente com que a prefeitura adotasse medidas pontuais para atender demandas estruturais. É o que acontece com a cultura o tempo todo: pouco dinheiro, mau gestão e medidas pontuais para responder um problema que é estrutural e histórico. A cultura sempre foi tratada como uma área qualquer, apesar de empregar muitos funcionários e guardar a capacidade de contribuir significativamente para o desenvolvimento social.

Um entendimento da cultura como uma política de Estado, que pode estar articulada entre políticas de outros setores públicos, pode ter um papel determinante na vida de crianças, jovens, adultos e idosos, prevenindo muitos problemas que acabam parando na educação, na segurança pública e até mesmo da saúde. Além de contribuir para a formação do pensamento.

O trabalho de artistas e mobilizadores culturais já foi utilizado em ações de sensibilização do público para assuntos graves em diversas cidades. Mas, isso é só uma pequena possibilidade para quem acha que cultura é só entretenimento. Há também a importância de preservação do patrimônio que poderia estar atraindo turistas e investimentos na cidade, provendo fortalecendo a memória de um povo e o imaginário popular tão fundamental para desenvolvimento das pessoas. A cultura tem uma força simbólica que possibilita uma reflexão sobre o humano e o mundo possível além da barbárie.

Enquanto artista trabalhador da cultura, estou realmente muito cansado. Ainda resisto sem sair de Contagem para tentar estabelecer meu trabalho em outras cidades como muitos fazem legitimamente, mas, ao mesmo tempo sem perspectiva local para um trabalho que desenvolvo a 15 anos com teatro, literatura e culturas populares. Imaginem então, para o artista que está começando. É quase que impossível projetar algo na cidade. A começar pela falta de espaços como teatros, galerias de arte, bibliotecas, centros culturais, museus, cinemas, salas para oficinas e cursos, funcionamento dos poucos aparelhos culturais nos finais de semana e a noite. Tudo isso deveria ser entendido como um direito para garantir a possibilidade de produção ao artista e de acesso e formação para quem deseja vivenciar cultura na cidade.

Considero, por tanto, que os atuais gestores, que foram vereadores deveriam ter agido com mais compromisso com a cultura. Inclusive, conquistamos a criação de uma comissão externa de cultura dentro da câmara, comissão essa que deveria discutir o orçamento com a chegada de um projeto de lei para estipular previsão orçamentária para este ano. O projeto foi aprovado no final de ano, ou seja, já se sabia quem seria o próximo prefeito e naquele momento, a maioria dos vereadores o apoiavam. Em resumo, não há muito o que explicar, apenas não fizeram a discussão sobre a questão cultural que tantas vezes foi pautada dentro da câmara nos últimos quatro anos. Isso significou uma perda para a cidade e o problema precisa ser resolvido, seja por emendas, verbas de outras áreas como por exemplo, dos próprios vereadores e da câmara municipal, que tem uma previsão de orçamento em mais de 45 milhões apenas no ano de 2017.

É urgente que se discuta também o Plano Municipal de Cultura que tem vários pontos soltos; a reestruturação dos conselhos, dos editais de prêmios e do Fundo Municipal de Cultura, que hoje, sinceramente, se encontra como um edital de migalhas que não incentiva de fato ações com perspectiva de continuidade.

Por fim, nós artistas, trabalhadores da cultura e interessados no tema, devemos começar a nos mobilizar para dialogar, como sempre fizemos, e para reivindicar nossos direitos. No atual estado de coisas em que vivemos no Brasil, qualquer avanço em direitos é uma conquista. No caso de Contagem, mais do que nunca, é tempo de continuar buscando mudanças.


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