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Pus os pés no chão e a terra tremeu

Hoje acordei com um susto, um tremor, no corpo, na janela do quarto e nas paredes da casa. Tive a impressão de ter ouvido, ainda em sonho, um forte barulho, como o de um trovão, mas ao olhar para o céu vi que estava sem nuvens, sem nenhum sinal de chuva. "Seria uma explosão?", pensei.

Tentei voltar a dormir, com uma sessão de corpo agitado, o que ainda continua, talvez por que a corpo sinta intimamente os tremores da terra, como Pedro Orce, personagem da "Jangada de Pedra" de Saramago.

Mais tarde fui saber, que realmente, a terra tremeu em minha cidade. O observatório sismológico da USP, minha cama, a janela do quarto e as paredes, registraram um tremor de terra em Esmeraldas nessa manhã de segunda. O tremor atingiu 4,2 graus na Escala Richter. e foi sentido em várias cidades da região, como aqui em Contagem. Por sorte estamos no centro da placa sul-americana, fosse nas bordas, conviveríamos com grandes terremotos com magnitude de até 6 graus.

De qualquer forma, o tremor trouxe-me a lembrança deste livro "A Jangada de Pedra", de José Saramago, onde um pedaço de terra se solta do continente e sai vagando pelo oceano e apenas o personagem Pedro Orce sente no corpo continuamente os tremores da terra.

"Pus os pés no chão e a terra tremeu". Diria Pedro Orce, que a causa de tremer a terra foi ter batido com os pés no chão quando se levantou da cadeira, forte presunção a sua, se não nossa, que levianamente estamos duvidando, se cada pessoa deixa no mundo ao menos um sinal, este poderia ser o de Pedro Orce, por isso declara, Pus os pés no chão e a terra tremeu.
Extraordinário abalo foi ele, que ninguém deu mostras de o ter sentido, e mesmo agora, passados dois minutos, quando na praia a vaga já refluiu diz consigo mesmo, Se eu for contar chamam-me mentiroso, a terra vibra como continua a vibrar a corda que já deixou de ouvir-se, sente-a Pedro Orce nas solas dos pés, continua a senti-la quando sai da farmácia para a rua, e ninguém ali dá por nada, é como estar a mirar uma estrela, dizer, Que linda luz, que formoso astro, e não poder saber que ela se apagou no meio da frase, hão-de os filhos e os netos repetir as palavras, pobres deles, falam do que está morto e chamam-lhe vivo, não é só na ciência astronômica que acontece esse engano. Aqui é ao contrário, juraria toda a gente que a terra está firme e só Pedro Orce afirmaria que ela treme, ainda bem que se calou, e não correu espavorido, aliás as paredes não oscilam, os candeeiros suspensos estão como fio-de-prumo, e os passarinhos da gaiola, que costumam ser os primeiros a dar o alarme, dormem tranquilos no poleiro, com a cabeça debaixo da asa, a agulha do sismógrafo traçou e continua a traçar uma linha recta horizontal no papel milimétrico.

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